junho 30, 2011

Ergologia: um olhar sobre o trabalho

Por Bernadette Vilhena

A perspectiva ergológica surgiu na França no início da década de 80 apartir de discussões de um pequeno grupo de pesquisadores (Yves Schwartz, Daniel Faita, Bernard Vuillon e Jacques Duraffourg) acerca das mudanças do trabalho nos anos 80, onde surgiu a questão “O que é o trabalho?” e também a necessidade de construir um acesso mais profundo e rigoroso ao mundo do trabalho, ao que era trabalhar para poder avaliar a transformação em curso (declínio parcial do taylorismo e mudanças tecnológicas).

Para avaliar essa mudança era preciso aproximar do trabalho de modo mais simples, diferente dos moldes acadêmicos já instituídos. O que começou a ser construído a partir de então, foi um constante vai-e-vem entre saberes acadêmicos sobre o trabalho e os saberes engajados dos trabalhadores no mundo do trabalho.
 
Trata-se de uma outra maneira de ver o trabalho, focando o ponto de vista da atividade do trabalhador, não na ótica de um “recurso humano a ser administrado”
Esta experiência vai se estruturar progressivamente em “APST”(Análise Pluridisciplinar das Situações de Trabalho), em 1999 no Departamento de Ergologia na Universidade de Provence, em cursos de especialização, pesquisas, rede científica e associativa nacional e internacionalmente.

A Ergologia não é uma nova disciplina científica, mas uma maneira epistemologicamente renovada de produzir conhecimentos sobre o trabalho, levando-se em conta a experiência da lida dos trabalhadores, propiciando reconhecimento do trabalho como experiência histórica e sociocultural (CUNHA, 2005)

As referências teóricas de base da Ergologia foram os conceitos da Ergonomia da Atividade, principalmente a distinção entre trabalho prescrito e trabalho real; a metodologia de Ivar Odonne usada para conhecer a maneira pela qual os trabalhadores executam sua atividade de trabalho e as referências filosóficas de Georges Canguilhem que estudou a saúde como objeto de problematização filosófica, examinando a oposição normal/patológico nas ciências biomédicas (BORGES, 200?).

A Ergologia traz um encontro de saberes, promove um “desconforto intelectual” (compreensão parcial das situações), demonstra que o trabalho é atravessado por questões societárias, valores pessoais e socioculturais, relações complexas, por formas de inteligências sociais diferentes e complementares. Apresenta uma metodologia pedagógica aberta onde os pesquisadores têm a oportunidade de retrabalhar conceitos, conhecer o universo de trabalho e sua cotidianidade, sair da postura de observador e desenvolver-se de uma forma diferente.

Enquanto os trabalhadores têm a possibilidade de apropriar-se de seus saberes investidos, ampliar conceitos e normas em torno de seu trabalho, entender a lógica das normas, conhecer melhor a organização a qual pertence, enriquecer seu coletivo de trabalho e transformar as “dramáticas do uso de si”. Unindo esses saberes contidos nesses dois universos aparentemente distantes entre si e mais um terceiro elemento essencial chega-se ao que Schwartz chama de “Dispositivo dinâmico de três pólos”. “Um dispositivo de trabalho cooperativo, de formação” (SCHWARTZ, 2007) onde temos:
  • Pólo dos Saberes Constituídos, saber formal das disciplinas, conceitos, regras e normas
  • Pólo dos Saberes Investidos, saber tácito presente na atividade, seriam “forças de convocação e validação” onde a recriação e o debate de normas são constantes.
  • Pólo das exigências ético-epistemológicas, do desconforto intelectual e sobretudo do respeito ao indivíduo, de estar disponível para aprender com ele.
O dispositivo de três pólo é o lugar de encontro, o lugar de trabalho comum em que se ativa uma espécie de espiral permanente de retrabalho dos saberes, que produz retrabalho junto às disciplinas, umas em relação as outras, portanto que transforma eventualmente um certo número de hipóteses, de conceitos entre as disciplinas.Temos aí uma verdadeira matriz de interdisciplinaridade que não é artificial. (SCHWARTZ, 2007)

O indivíduo sempre procura tornar-se o meio, o centro de seu trabalho e esse trabalho é execução e uso, “uso de si por si mesmo” e uso de si pelos outros”. Dentro do debate de normas constantemente presente na atividade ocorre as “dramáticas do uso de si”.

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